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A Psicanálise cura? (Fugindo da dor e da ansiedade que não me abandona)

  • Foto do escritor: Luciana Borges
    Luciana Borges
  • 3 de nov. de 2023
  • 3 min de leitura

Atualizado: 6 de nov. de 2023


“Se submeter a uma análise implica percorrer as páginas da própria história. É de lá que nos observam os nossos pais, a criança que fomos e aquelas cenas que, ocultas sob a névoa do esquecimento ou do recalque, escondem a chave que conduz a uma verdade que pode nos transformar”. Gabriel Rolón

Tem um importante autor da Psicanálise, chamado J. D. Násio, que ousou responder a essa pergunta de forma bem direta: Sim, a Psicanálise cura. Gosto das pessoas corajosas, que não temem responder diretamente a perguntas que poderiam em outros casos parecer mais amplas e abstratas.


Nasio tem essa forma didática de encarar um processo de análise: é preciso que o analista tenha bagagem, estudo, teoria. Mas é preciso que ele esteja aberto ao encontro com o paciente. Porque é desse encontro que surgem novos caminhos para aquele que começa uma terapia querendo sair de uma dor.


Se não somos capazes de entender profundamente a dor que aflige essa pessoa, não existirá caminho para a cura. Na análise, vasculhamos pedacinhos esquecidos da história de cada paciente. Fazemos perguntas difíceis, e muitas vezes rimos e choramos. Porque cada um tem seu próprio armário de complexas teias familiares, de lembranças turvas e relações que não querem ser rememoradas. Ainda assim, a Psicanálise diz: volta lá, porque existe algo a mais além da memória que ficou para trás. Esse algo a mais tem muitas possibilidades: medos, traumas, o congelamento de partes do corpo onde o afeto não pôde ser vivenciado, a experiência do abandono e muitas outras coisas.


Nesse encontro entre duas pessoas - paciente e analista - existe uma cumplicidade. Caminhamos juntos até que aquele que buscou ajuda comece a sentir que a vida é maior e com mais possibilidades do que quando chegou. Isso porque uma das grandes contribuições que a análise traz é a de que nós nos fechamos para novas possibilidades para o futuro porque uma parte de nós, que não temos nem consciência, ficou presa no passado. Uma vez que a pessoa começar a entrar em contato com esses lugares aprisionados dentro de si, micro-revoluções internas começam a acontecer - e esse é o caminho da cura.


Mas como seria possível entrar em contato com a dor sem querer fugir dela? Assim como o Nasio responde diretamente à pergunta sobre a cura pela Psicanálise, todos aqueles que estão em terapia em algum momento também precisarão enfrentar a vontade de fugir daquilo que lhes machuca e encarar com coragem as suas dores. Porque lá está a semente da transformação.


É comum chegar alguém com um grau de ansiedade intenso no início da terapia e dizer que não sabe o porquê de tanta ansiedade. Aquele pânico de que de repente tudo pode dar errado. Pouco a pouco, vamos desvelando as camadas do pensamento de cada um e descobrindo de onde vem essa ânsia por não saber do futuro. Às vezes, a ansiedade não é sobre o futuro, mas sobre o que ficou lá atrás e o sujeito não pôde carregar isso consigo, para um tempo presente, por ser uma bagagem muito difícil de carregar.


Na psicoterapia, fazemos esse trabalho de pacientemente ir buscar objetos esquecidos na mente de cada pessoa. E muitas vezes encontramos essas pessoas corajosas, que pouco a pouco vão desvendando partes de si que não queriam encarar. E aí o coração começa a bater com mais calma, porque está encontrando o seu lugar dentro de si. O tempo corrido do lado de fora vai ficando mais distante e o sujeito percebe que internamente há um tempo diferente - o tempo da sua própria história.


Aquilo que causava tanta angústia se transforma em novos risos e choros - no tempo do viver agora. O paciente descobre que não precisa mais estar sozinho para suportar o peso de habitar-se em si. Se existe alguém, aqui o psicólogo, que consegue olhar para o todo daquela pessoa sem julgamentos, ela começa a se perceber mais inteira. A cura é apontada para a possibilidade de se descobrir sendo exatamente quem se é sem a crítica extrema do outro que foi internalizada. Aceitar-se aplaca grande parte da ânsia por controlar resultados.


E, no fim, a cura: ser quem se é, sem deixar pedaços de si para trás.

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